Em um dos momentos curiosos desse primeiro dia de Cannes Lions 2025, William Bonner abriu o painel da Globo com uma revelação: antes de ser o rosto do Jornal Nacional, ele era publicitário formado pela USP. “Se a Globo não tivesse me convidado, eu teria a cara de pau de implorar para vir”, confessou o jornalista, mostrando uma foto de 1984 onde aparece aos 20 anos como Profissional do Ano em publicidade.
Por que importa: No ano em que o Brasil é homenageado como país criativo em Cannes – fato inédito na história do festival – a Globo busca reafirmar parceria de 100 anos com o mercado publicitário brasileiro.
“O Padrão Globo é uma construção coletiva com vocês”
Bonner foi direto: o famoso “Padrão Globo de Qualidade” não é mérito solo da emissora:
“O que seria da Globo se não tivéssemos a inventividade de vocês nos intervalos comerciais? A democracia brasileira deve muito a vocês, financiadores de uma televisão, internet, rádio e jornal independentes.”
A fórmula brasileira: Gambiarra + IA = dupla imbatível
Anselmo Ramos (fundador da GUT) propôs a combinação do século:
“A melhor dupla do mundo é um brasileiro e uma IA. O brasileiro traz criatividade, trabalha 24 horas, fica pedindo aumento… está ali do seu lado para sempre.”
Sergio Gordilho (Africa Creative) complementou: a IA finalmente quebra a barreira histórica da produção brasileira. “A gente criava no Brasil, mas produzir era difícil. Nosso bolso é em real, mas a produção é em dólar – 6 para 1.”
“React Advertising”: o Jornal Nacional como briefing diário
Anselmo Ramos apresentou conceito provocador:
- Todo dia surgem “briefings possíveis” na cultura popular
- O que Bonner noticia pode virar campanha
- Marcas que conhecem seu posicionamento podem reagir em tempo real
- “O Jornal Nacional é um briefing constante”
Talento brasileiro já domina o mundo (e o sotaque é charme)
Sergio Gordilho revelou o “segredo que não é mais segredo”:
- Todas as melhores agências do mundo têm brasileiros
- Não apenas como criativos, mas como ECDs (Executive Creative Directors)
- “Nunca tenha vergonha do seu sotaque – ele significa que você fala a língua do outro”
- “Os clientes adoram o sotaque brasileiro”
“Era um menino de Moema, classe média, não falava inglês. Hoje trabalho pelo mundo e estou abrindo agência em Nova York e Xangai.”
Liderança e diversidade: o novo mandamento
Keka Morelle (Ogilvy), com 40 anos de carreira, foi enfática:
“Não tem como falar de Brasil sem falar de diversidade, equidade e inclusão. Líderes brasileiros precisam estudar o Brasil em suas diversas formas.”
Ela conectou diretamente ao resultado: “Diversidade é lucratividade. Times diversos geram melhores resultados e maior conexão com as pessoas.”
50 anos do primeiro Leão de Ouro: de coadjuvante a protagonista
Gordilho lembrou que 2025 marca meio século desde o primeiro Leão de Ouro brasileiro e filosofou sobre o papel da publicidade:
“A função da propaganda sempre foi, sendo coadjuvante, trazer coisas surpreendentes e memoráveis. Quando queremos impor protagonismo, nos perdemos.”
O pacto para os próximos 100 anos
Maju Coutinho encerrou celebrando a “matança de leões” diária no Brasil – mas aqui em Cannes, “queremos levar os leões bem vivos para casa”.
O compromisso final, nas palavras de Gordilho: “Temos que deixar a indústria criativa forte para a próxima geração, como a anterior fez por nós.”
A provocação que fica: Em tempos de IA e transformação digital, o Brasil aposta que sua “gambiarra criativa” – a capacidade de fazer muito com pouco – é justamente o diferencial que, turbinado por tecnologia, pode dominar os próximos 100 anos de publicidade global.